Dias de extremo calor e frio marcaram o inverno no Sul |
A alternância de dias muito quentes e muito frios que o
País viveu neste inverno, se olhada individualmente, pode ser explicada pela
variação normal do clima. Mas se observada dentro de uma sequência de
oscilações de eventos extremos ao longo dos últimos anos pode ser interpretada
como mais um sinal de que as mudanças climáticas já estão acontecendo.
Essa é uma das conclusões que podem ser tiradas do
primeiro relatório de avaliação nacional que o Painel Brasileiro de Mudanças
Climáticas (PBMC) divulgou no dia 9 de setembro último, em São Paulo.
O trabalho é resultado do esforço de 345 pesquisadores, das mais diferentes
áreas, que avaliaram estudos feitos desde 2007 sobre os impactos do aquecimento
global no Brasil.
"Oscilações de extremos são coincidentes com as
mudanças climáticas. Com o aquecimento da atmosfera, ela fica mais instável, o
que cria uma variabilidade de extremos. Do muito quente para o muito frio. Do
muito úmido para o muito seco", explica o
meteorologista Tercio Ambrizzi, da USP, coordenador do grupo de trabalho 1 do
painel.
Ao analisar o histórico de ocorrência desses eventos, os
pesquisadores observaram que, nos últimos 30 anos, tem aumentando a frequência
de chuvas fortes (com mais de 60 milímetros de água) no inverno do Sul e do
Sudeste, onde a estação é seca. "Isso não ocorria antes dos anos 70,
por exemplo. Se fosse uma ou outra chuva só, poderia ser uma simples variação,
mas o aumento desses eventos nos diz que algo está diferente. É uma resposta
local às mudanças globais", afirma.
O mesmo vale, diz ele, para as duas secas históricas
experimentadas pela Amazônia em 2005 e 2010.
Esse olhar sobre o passado, somado aos trabalhos com
modelagens climáticas, ajuda a entender o que as projeções têm indicado para as
próximas décadas. O relatório mostra uma elevação de temperatura de 2,5°C a 5°C
nos meses de verão, e de 3°C a 6°C no inverno, até o final do século. A
variação depende do bioma analisado.
Em relação às chuvas, há uma previsão de diminuição de
até 50% no inverno no Nordeste e aumento de até 35% no Rio Grande do Sul. "O que as projeções mostram coincide com o que já estamos
sentindo", comenta Ambrizzi. Em geral, o relatório aponta para o
aumento de períodos de seca prolongada e de chuva forte, assim como a
ocorrência de fenômenos naturais com forte poder de destruição.
Ocorrência de secas e enchentes serão cada vez mais comuns |
Consequências
Além da base científica das mudanças climáticas, o
trabalho analisa também os impactos que elas terão nos diversos setores da
economia, as principais vulnerabilidades do País e também sobre como ele está
se adaptando ao que está por vir. Esses são os temas do grupo de trabalho 2. Há
ainda um terceiro, que aborda como o Brasil está mitigando suas emissões de
gases de efeito estufa.
De acordo com o engenheiro agrícola Eduardo Assad, da
Embrapa, os estudos mostram uma tendência de que a mudança do clima afete a
oferta hídrica. Rios do leste do Amazonas e do Nordeste do Brasil podem sofrer
uma redução de vazão de 20%. Os da bacia do Tocantins, de até 30%. Já os da
bacia do Prata, na região Sul, poderão ter aumento de 10% a 40%.
"Isso pode trazer problemas para a oferta energética
na Amazônia, justamente onde estão concentrados os esforços do governo para a
construção de hidrelétricas", diz
Assad.
Outro impacto poderá ser observado sobre os ecossistemas
oceânicos. Segundo Assad, nos próximos 40 anos eles poderão sofrer uma redução
de 6% do potencial máximo de pesca. "O que percebemos nesse levantamento,
porém, é que há várias lacunas científicas. E uma delas é justamente sobre essa
região, onde vive a maior parte da população do Brasil e muitas pessoas
dependem desses recursos."
Para entender.
O Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas é um organismo
científico composto por 345 pesquisadores, que foi criado em 2009 pelos
ministérios da Ciência e Tecnologia e do Meio Ambiente para reunir, sintetizar
e avaliar informações científicas sobre os impactos relevantes das mudanças
climáticas no Brasil. Seu primeiro relatório, divulgado hoje na 1.ª Conferência
Nacional de Mudanças Climáticas Globais, organizada pela Fapesp, é um retrato
do que melhor se conhece dos impactos que o aquecimento global terá no País.
O PBMC foi elaborado no mesmo modelo do Painel
Intergovernamental das Mudanças Climáticas (IPCC), da ONU, que também elabora
relatórios em nível mundial sobre as mudanças climáticas.
Fonte: www.estadao.com de 09 de setembro de 2013.
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